Leia tudo:
O ex-presidente do Banco Central Affonso Celso Pastore
considera que o país está preso a um círculo vicioso em que a recessão reduz a
arrecadação do governo, elevando a necessidade de mais cortes de gastos e
aumento de carga tributária, gerando mais recessão.
Para ele, o atual governo está pagando o custo político
da falta de confiança da sociedade na sua capacidade de fazer a economia voltar
a crescer. "O único caminho é continuar com o ajuste fiscal até recriar a
confiança", disse à Folha. "Mas o desemprego ainda não chegou ao
pico. É difícil prever qual vai ser a reação do governo."
Pastore acredita que a saída da recessão será lenta e o
crescimento só voltará, devagar, em 2016.
Folha - O ajuste fiscal promovido pelo governo é
suficiente?
Affonso Celso Pastore - O ajuste é necessário. O
país entrou numa trajetória insustentável de crescimento da relação dívida/PIB.
Se perdêssemos o grau de investimento, o ajuste seria mais traumático e
acentuaria o período de estagnação.
Agora, qual é o tamanho do ajuste necessário? O Levy
optou por um ajuste gradual; nas atuais circunstâncias, não é suficiente para
trazer o crescimento da dívida para uma trajetória sustentável.
Por quê?
No ano passado, o crescimento da economia foi nulo. Neste
ano, teremos uma recessão em torno de 1,5%. Os investimentos estão caindo muito.
Com sorte, no futuro, poderemos crescer 1%. Com um juro real de 6% e essa
perspectiva de crescimento, é preciso um superavit primário [economia para
pagar juros] de 3% do PIB para estabilizar a dívida.
Mas isso é factível?
Se é factível ou não, é outra discussão, mas é o
necessário para estabilizar a dívida. Se não chegar a esse patamar, é preciso
continuar fazendo ajuste fiscal nos próximos anos. As alternativas seriam
reformas que acelerassem o crescimento ou um aumento de confiança no governo
que permitisse a redução de juros. Nada disso está visível agora. Portanto,
esse ajuste fiscal é insuficiente.
O governo cortou R$ 69,9 bilhões de gastos do Orçamento.
Foi adequado?
O problema é a arrecadação de impostos. Ouvi atentamente
o pronunciamento do ministro Nelson Barbosa [Planejamento] e não sei de onde
ele tirou aquele crescimento de 5,8% da receita. Aquilo não existe com essa
desaceleração da atividade.
Ele disse que podemos ter receitas extraordinárias e
citou o exemplo da venda da seguradora da Caixa. Se essa operação tiver um
enorme sucesso, vai produzir um infinitésimo do necessário. As concessões de
infraestrutura também não serão um sucesso de arrecadação. Corremos o risco de
mais cortes de gastos e mais carga tributária.
O que gera mais recessão. Parece um círculo vicioso.
Temos uma forte retração do consumo das famílias, que é
consequência do aumento do desemprego. Os bancos estão pisando no freio do
crédito, para provisionar recursos para abater os prejuízos que tiveram com
Petrobras, Sete Brasil, empreiteiras.
O consumo está caindo e o investimento também. Não tenho
dúvida de que o PIB do segundo trimestre vai cair bem mais do que o do primeiro
e que, no terceiro, possivelmente teremos queda também. Ou seja, o governo vai
perder mais arrecadação, o que gera maior necessidade de cortes, acentuando a
recessão. É um círculo vicioso.
Como quebrar esse círculo?
As pessoas têm mania de comparar as recessões. Na última
recessão, em 2009, o governo podia cortar imposto e aumentar gasto. Com a
inflação próxima da meta, foi possível baixar juros. Quando faltou crédito, o
governo reduziu o compulsório. Nada disso é possível desta vez. E o comércio
internacional agora está estagnado. Portanto, essa recessão é mais longa e o
ajuste vai prosseguir por mais tempo. A saída é continuar no ajuste até recriar
a confiança e pagar o custo político.
O governo está disposto a pagar esse custo?
O Levy está isolado, com uma certa ajuda do
[vice-presidente] Michel Temer. Ele joga de centroavante, ponta-direita,
goleiro. Mas o que existe hoje é tarefa para mais do que um ministro da
Fazenda. Precisa-se de todo o governo para fazer isso.
Ele briga por cada medida e vai sofrendo derrotas. Logo
não consegue completar o círculo em velocidade suficiente para gerar aumento de
confiança. Com isso, não volta o investimento e a economia não cresce. A
recessão vai ficando mais longa. O crescimento só deve voltar, lentamente, em
2016.
A fragilidade política do governo piora a situação?
O atual governo paga o custo político da falta de
confiança da sociedade na sua capacidade de entregar o crescimento econômico.
O custo político gera uma profecia que se autorrealiza.
O mercado adora pessoas otimistas, que dizem que o Brasil
é maior do que a crise. É mesmo, mas não é imediato. Isso implica alternância
de poder, o que ainda não está à vista. A solução mais fácil é a presidente e
seu partido fazerem um grande acordo nacional, cedendo poder a outros partidos.
Sem isso, é inverossímil entregar mais crescimento econômico.
O BC paga pelos erros passados, quando desancorou as
expectativas de inflação. Agora tem que praticar juros mais altos a um custo
social maior. Infelizmente, temos que pagar por esse erro.
O senhor vê algum risco de o governo desistir do ajuste?
A lógica é que ele não desista de nada, porque o custo
alternativo é muito maior. Mas a pressão social ainda não chegou ao topo,
porque o desemprego não chegou ao pico. Quando isso ocorrer, é impossível
prever a reação que o governo vai ter.
2 comentários:
Esse tal de Ajuste do Levy do Bradesco é apenas mais um Confisco disfarçado. Confisco, aliás, proibido pela Constituição. Mas quem liga prá Constituição nesse País? nem o STF.... @fitzca
Vidente !
http://lucianoayan.com/2014/08/01/para-economista-dinamarques-eleicao-de-dilma-pode-ser-uma-boa-ideia-pois-ai-o-brasil-afunda-de-vez/
Postar um comentário