O jornalista Marcelo Monteiro, denuncia na edição de hoje do jornal Zero Hora que entre agosto de 2011 e novembro de 2014, atual
corregedora-geral penitenciária recebeu pagamentos extras por viagens em 712
dos 837 dias úteis. O Tribunal de Contas avalia que, em vez de usar pagamentos
extras de forma recorrente, o ideal seria realocar a servidora
Ao lado, fotos de Mário Luis Pelz, superintendente adjunto da Susepe, e
Mônica Pires da Silva, corregedora penitenciária, segundo fotos da própria Susepe.
Por três anos e quatro meses, a atual corregedora-geral
do sistema penitenciário gaúcho, Mônica Pires da Silva, recebeu diárias para
viagens entre Porto Alegre, onde estava lotada como técnica penitenciária, e os
municípios de Montenegro, Charqueadas e Arroio dos Ratos, em um raio de cerca
de 60 quilômetros da Capital. A prática fere a Lei Estadual 10.098 (1994) – o
estatuto único dos servidores públicos – e o Decreto 24.846 (1976), além de
princípios das Constituições Estadual e Federal. No período, a servidora
recebeu mais de R$ 52 mil em diárias. As informações foram obtidas por Zero
Hora no portal Transparência RS.
Técnica superior penitenciária desde 2002, Mônica já
havia sido corregedora-geral entre junho de 2009 e fevereiro de 2010. Em agosto
de 2011, a servidora iniciou um período de 40 meses em que realizou diárias de
forma quase ininterrupta, com raras semanas sem receber (fevereiro e novembro
de 2012, janeiro e outubro de 2013 e fevereiro de 2014). Nos 837 dias úteis até
novembro de 2014, recebeu diárias em 712 (85% do total). Em 12 dos 40 meses,
fez diárias em todos os dias úteis
Nos dois primeiros anos do período, Mônica estava lotada
na Corregedoria-Geral da Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe),
em Porto Alegre. Em dezembro de 2013, foi transferida para o Instituto Penal
Irmão Miguel Dario, também na Capital. Em 27 de janeiro de 2015, dois meses
após o período de 40 meses de diárias, ela foi novamente designada
corregedora-geral da Susepe.
Segundo o Tribunal de Contas do Estado (TCE), nos casos
em que o deslocamento de forma permanente torna-se essencial ao serviço, o
órgão público deve realocar o funcionário na cidade-destino, contratar outro
servidor para suprir a deficiência no local ou cogitar o pagamento de ajuda de
custo, em vez de diárias.
Conforme o TCE, a diária tem caráter indenizatório e visa
custear estadia e alimentação quando o servidor desloca-se por necessidade de
trabalho. Quando adotada de forma contínua e ininterrupta, a prática se
transforma em complementação de renda do servidor, transformando o que era
indenizatório em remuneratório.
Outra possível irregularidade seria a realização de
diárias por parte da servidora sob a rubrica "reforço de vigilância",
uma vez que Mônica é técnica superior penitenciária. A Lei 13.259, que dispõe
sobre o quadro especial de servidores, diz que as atividades de vigilância são
atribuição dos agentes penitenciários – e não dos técnicos.
Diretor realizou diárias em 279 dias
O atual superintendente-adjunto e diretor do Departamento
de Segurança e Execução Penal (DSEP), Mario Luis Pelz, realizou diárias durante
mais de um ano, recebendo mais de R$ 18 mil no período. Agente penitenciário
desde 1993, Pelz foi nomeado diretor de Departamento de Segurança e Execução
Penal (DSEP) em 1º de janeiro de 2011, condição na qual permaneceu até outubro
de 2013.
Em 6 de novembro daquele ano, uma semana após deixar o
cargo, o agente iniciou um período de 309 dias úteis nos quais recebeu diárias
de viagem em 279 (90,3% do total), com exceção de algumas semanas em março e
setembro de 2014, sempre no município de Charqueadas. Em cinco dos quase 15
meses do período, encerrado em 19 de janeiro deste ano, Pelz fez diárias em
todos os dias úteis. Uma semana depois, em 27 de janeiro, reassumiu o DSEP e a
superintendência-adjunta.
R$ 52,07 mil
Foi o total recebido por Mônica
R$ 18,08 mil
Foi o total recebido por Pelz
TCE e MPC analisam casos similares
Casos semelhantes aos de Mônica e Pelz são apurados pelo
Tribunal de Contas do Estado (TCE) e pelo Ministério Público de Contas (MPC).
Em auditoria referente ao exercício 2013, auditores do TCE mencionam o caso de
um agente da Susepe lotado no DSEP, em Porto Alegre, que recebeu diárias para
trabalhar na Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas (Pasc) em
praticamente todos os dias de 2013. Segundo os auditores, "a necessidade
habitual de prestação de serviços pelo servidor, durante praticamente todo o exercício
de 2013, descaracteriza o instituto das diárias, sendo que seria mais vantajoso
para a Susepe efetuar a remoção do servidor para a Pasc, evitando o dispêndio
de R$ 13.720,45 com diárias prescindíveis".
Portanto, concluem os auditores, "o valor das
diárias pagas [...] é passível de devolução aos cofres públicos, pois se refere
a pagamentos desnecessários em decorrência da execução de atividades laborais
em local diferente da lotação do servidor de forma habitual, sem que houvesse a
formalização da sua remoção". O processo ainda não foi julgado.
O procurador-geral do MPC, Geraldo Da Camino, afirma que
situações similares às de Pelz e de Mônica são analisadas pelo órgão.
– Os casos (mencionados por ZH) parecem se enquadrar
nesta mesma moldura e denotam, em princípio, falhas de planejamento que podem
ter levado a despesas desnecessárias – avalia Da Camino.
Na opinião do procurador, a responsabilidade maior sobre
eventuais irregularidades recai sobre os gestores que ordenam a realização das
diárias.
– O agente público que autoriza diárias em desacordo com
os princípios administrativos pode responder financeiramente pelo gasto
indevido.
O QUE DIZ A LEI
Lei 10.098 (1994)
Artigo 95
§ 3º - Não serão devidas diárias nas hipóteses em que o
deslocamento da sede se constituir em exigência permanente do serviço.
Decreto 24.846 (1976)
Artigo 5
§ 2º - Não caberá concessão de diárias quando:
a) o deslocamento for exigência permanente do exercício
do cargo ou atribuição.
Constituição Estadual
Artigo 19
A administração pública direta e indireta de qualquer dos
Poderes do Estado e dos municípios, visando à promoção do bem público e à
prestação de serviços à comunidade e aos indivíduos que a compõem, observará os
princípios da legalidade, da moralidade, da impessoalidade, da publicidade, da
legitimidade, da participação, da razoabilidade, da economicidade...
Constituição Federal
Artigo 37
A administração pública direta e indireta de qualquer dos
Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá
aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e
eficiência...
CONTRAPONTOS
O que dizem
Gelson Treiesleben, superintendente da Susepe entre 2011
e 2014
A Susepe se utilizou dos diaristas por um longo período
para suprir a deficiência de servidores. A contratação de novos servidores
sairia mais cara para o ente público, porque o servidor ganha em diárias o
equivalente a um terço do valor de um servidor normal. Existem "n"
servidores na mesma situação. Há servidores que, inclusive, trabalharam mais do
que estes. Se forem contabilizados todos os servidores da Susepe, são cerca de
5 mil. Por isso, não poderia falar especificamente sobre um ou outro caso.
Mario Luis Pelz
Em 11 de novembro de 2013, foi designado administrador
interino da Pasc, sem receber valores adicionais referentes à função, condição
na qual permaneceu até janeiro de 2015. A Lei 24.018, de 2012, autoriza a
realização de diárias de reforço de contingente com regularidade, restringindo
o pagamento de diárias de deslocamento aos casos em que o servidor precisa
viajar a outro município em situações excepcionais. Nos casos em que a presença
em outro município ocorre com regularidade, as diárias pagas são de reforço,
cujos valores são inferiores às de deslocamento.
Mônica Pires da Silva
Integrava um projeto-piloto iniciado em 2010, que era
realizado em todas as regiões do Estado e exigia acompanhamento dos
responsáveis. Todos os deslocamentos foram comprovados por folha-ponto e por
atestados do diretor do estabelecimento prisional. Sobre as diárias na rubrica
"reforço de vigilância", diz que a Lei Complementar 13.259 estabelece
entre as atribuições do cargo de técnico superior penitenciário "planejar,
executar e avaliar os programas de individualização de pena visando a ações de
tratamento penal".