A escola de tempo integral e a campanha deste ano em Porto Alegre


Clipping / Correio do Povo / Domingo, 20/09 / Rogério Mendelsky

O GÊNIO DA EDUCAÇÃO
- A escola de tempo integral e a campanha eleitoral deste ano em Porto Alegre

Basta ligar o rádio ou a televisão e lá vem o horário político repleto de projetos educacionais apresentados por candidatos de todos os partidos. Mas o melhor de todos os que o Brasil conheceu – escolas de tempo integral – é tratado ainda com certa timidez ou com uma grande desfaçatez. A timidez porque até o velho quadro-negro sabe que educação em tempo integral é um projeto do governador Leonel Brizola e a desfaçatez, porque alguns candidatos falam como se estivessem mostrando ao eleitorado uma idéia nova na educação. Educação para todos foi e será sempre uma obstinação histórica de Leonel Brizola, talvez pela dificuldade que teve em sua juventude para chegar aos bancos escolares. Como homem público e já prefeito de Porto Alegre, Leonel Brizola pôde iniciar a sua missão educacional, ele que fora alfabetizado por sua mãe, dona Oniva, e que agora tinha um poder relativo para praticar seu maior projeto de homem público. Porto Alegre tinha um déficit escolar nas poucas escolas municipais existentes e ele deixou o governo da capital gaúcha com 137 novas unidades e dando a oportunidade para mais 35 mil alunos que perambulavam em busca de uma matrícula a cada início de ano letivo. Eleito governador do RS (1958), Leonel Brizola, em quatro anos, realizou o maior e mais audacioso plano educacional que os gaúchos conheceram e que, provavelmente, jamais será superado. O analfabetismo no RS, na década de 50, era assustador porque faltavam escolas primárias em locais distantes das sedes municipais. Leonel Brizola criou o Sedep (Serviço Descentralizado do Ensino Primário) e começou a construir escolas por todo o território gaúcho (algumas ainda estão aí, em ruínas, como se fossem marcos fronteiriços entre a escuridão da ignorância e a luz nas trevas), cujo projeto arquitetônico era simples, de madeira, mas elas abrigaram centenas de milhares de novos alunos. Até hoje, a herança de Leonel Brizola na educação é impressionante. No seu governo – janeiro de 1959 a janeiro de 1963 –, foram construídas 6.320 escolas, sendo que 5.911 de nível primário, 278 escolas técnicas e 131 ginásios e escolas normais. Com isso, 42.153 professores ganharam contratos e 700 mil alunos tiveram a chance de sentar num banco escolar.


OS MOTIVOS DE BRIZOLA – Em quem você vai votar? – Eu não posso votar porque sou analfabeto, mas se pudesse, votaria num tal de Brizola, que dizem ser o melhor candidato. O diálogo – narrado pelo jornalista Antonio Goulart, em seu livro 'As Tiradas do Dr. Brizola' – ocorreu entre Leonel Brizola e um trabalhador humilde, no interior do RS, durante a campanha eleitoral de 1958. Goulart diz que Brizola garantiu ao agricultor que, se chegasse a ganhar a eleição, o RS não teria mais analfabetos. Assim começou a obstinação de Leonel Brizola por uma educação para todos os brasileiros.

OS MOTIVOS DE COLLARES - Foi num almoço no Ciem batizado com o nome do vereador João Satte, na vila Cruzeiro do Sul, em Porto Alegre, que este colunista ouviu de Alceu Collares uma pequena história sobre a importância daquela escola de educação integral numa vila popular. Um pai aproximou-se do então prefeito Collares e disse-lhe com bastante intimidade: 'Collares, minha filha desde que entrou para essa tua escola me obriga a comprar papel higiênico para colocar no nosso banheiro. Ela disse que a professora lhe ensinou essa mania de higiene pessoal'. Se os Ciems tivessem prosseguido e se expandido por todo o RS, não estaríamos todos mais educados e mais higienizados? Hoje, é só o que se fala nos horários de propaganda eleitoral. E do tempo perdido, ninguém será responsabilizado?

TEMPO INTEGRAL - Mas Leonel Brizola não se considerava satisfeito pelo que já tinha realizado no RS. Seu projeto de ser presidente foi abortado em março de 1964. Por longos 15 anos, esteve exilado no Uruguai e nos EUA (asilado político por determinação do presidente Jimmy Carter, em 1977). Seu retorno, em 1979, deu-lhe a mesma notoriedade de líder político do trabalhismo, agora em plano nacional. Eleito por duas vezes governador do Rio de Janeiro – 1982 e 1990 –, pôs em prática outro velho sonho: educação em regime integral, onde o aluno entrava nos Centros Integrados de Educação Pública (Cieps) pela manhã e só saía no final da tarde, recebendo educação escolar, alimentar e esportiva, numa concepção pedagógica do professor Darcy Ribeiro. Nos seus dois mandatos, Leonel Brizola construiu 515 Cieps, os quais foram abandonados por outros governadores porque se tratava de um projeto educacional insuportável para qualquer político. Afinal de contas, Leonel Brizola não poderia ser transformado num gênio político que pensava nas próximas gerações do país que ele tanto amava.

COLLARES TAMBÉM FEZ - A exemplo de Brizola, Alceu Collares, em duas vezes na sua carreira política também seguiu o modelo educacional de seu líder. Como prefeito (1986 a 1989), construiu 16 prédios dentro do projeto de educação integral e como governador (1991 a 1995), 90 Cieps (conhecidos como Ciems). Também não teve a sua obra continuada por governantes que assumiram logo após ter deixado a prefeitura (Olívio Dutra) e o Palácio Piratini (Antônio Britto). Tanto Brizola como Collares, com acertos e erros, comuns a qualquer governante, não tiveram sorte em seus sonhos mais acertados e que, certamente, estariam proporcionando nos dias de hoje menos crimes, menos ignorância e menos desigualdade social para gaúchos e brasileiros. Afinal de contas, uma geração inteira já teria sido formada nas escolas de educação integral de Brizola e Collares.

E-mail: rogerio@radioguaiba.com.br

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