O chefe da divisão das Américas da Human Rights Watch (HRW), chileno José Miguel Vivanco (foto), 47, estava um tanto desnorteado ao chegar na manhã de ontem (20) no aeroporto de Guarulhos. Seu celular não funcionava -os agentes venezuelanos que o expulsaram do país confiscaram a bateria- e ele não tinha idéia de onde ir ao sair da sala de desembarque. Depois de comprar um telefone no aeroporto, ele e seu colega americano Daniel Wilkinson, 38, contataram o escritório da HRW em Washington, que organizou seu regresso aos EUA, num vôo que sairia ontem à noite. Enquanto esperavam a volta, eles passaram a tarde em um hotel do centro de Guarulhos. Vivanco relatou ao Jornal Folha de São Paulo os detalhes de sua conturbada saída de Caracas.
FOLHA - Como foi a sua expulsão?
JOSÉ MIGUEL VIVANCO - Na quinta, fomos jantar num restaurante italiano, Daniel Wilkinson e eu. Eram cerca de 22h15 quando voltamos ao hotel. Subimos até o 14º andar, e, quando saímos do elevador, nos deparamos com uns 20 agentes diante das portas dos nossos quartos.
Uns estavam fardados com roupa militar, outros estavam à paisana, com armas à cintura. O chefe nos leu uma declaração informando que estávamos intimados a deixar o país imediatamente, sob acusação de termos insultado o governo. Argumentei que aquilo não era verdade, em vão. Tentei mandar um torpedo ao embaixador do Chile, mas um dos capangas me arrancou brutalmente o Blackberry das mãos.
O aparelho me foi devolvido sem bateria, e o do Daniel foi destruído pelos agentes. Pedi então para fazer as malas, e me disseram que os agentes já haviam entrado no quarto e empacotado nossas coisas. Nos colocaram em jipes, e fomos levados a toda velocidade até o aeroporto num comboio de motos e carros com sirene.
FOLHA - Vocês sabiam aonde iam?
VIVANCO - Perguntamos várias vezes, mas não responderam. O comboio entrou diretamente na pista, sem passar pela alfândega ou balcão de embarque, e só entendemos qual seria nosso destino depois de sermos desembarcados na frente de um avião da Varig.
FOLHA - O avião ficou esperando?
VIVANCO - Sim, os passageiros já estavam havia duas horas a bordo do avião. As pessoas estavam irritadas e achavam que éramos VIPs ou amigos de Chávez que se davam ao luxo de parar um vôo comercial à sua espera. O comandante sabia que o governo havia comprado duas passagens para que pudéssemos ser expulsos do país.
FOLHA - Ao chegarem a Caracas, na quarta-feira, havia algum sinal de tensão?
VIVANCO - Quando chegamos, as autoridades confiscaram duas caixas com cópias do nosso relatório. Foi um sinal de que a coisa estava complicada.
FOLHA - O que responde às acusações de que a HRW recebe dinheiro do governo americano?
VIVANCO - Não temos vínculo algum com o governo americano. Basta entrar no nosso site para ver as críticas que fazemos aos EUA por causa de Guantánamo [base militar em Cuba aonde são levados os prisioneiros da guerra ao terror]. Somos uma instituição totalmente independente, financiada 100% por doações privadas.
FOLHA - Entre as numerosas críticas a Chávez, qual é a mais grave?
VIVANCO - A ausência de um Poder Judiciário independente. A Justiça venezuelana é um apêndice do Poder Executivo. Nosso relatório mostra que a Corte Suprema aceita a idéia de que quem não abraça o projeto bolivariano é um golpista.
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