Anotações de Marcelo Odebrecht revelam corrupção e também
muitos enigmas
Chamou-se “O jogo da imitação” o filme sobre a vida do
criptoanalista Alan Turing, que desvendou os códigos nazistas durante a Segunda
Guerra. O esforço coletivo será menor para desvendar as anotações no iPhone de
Marcelo Odebrecht. Elas revelam algumas indicações contundentes e inequívocas
de corrupção. Mas trazem muitos enigmas que nos impelem a devendá-los, pelo
menos para saber o que, realmente, aconteceu com o Brasil. E, é claro, extrair
as consequências.
Marcelo Odebrecht foi intitulado o Príncipe dos
Empreiteiros. Jovem, rico e bem educado, adotou a tática petista de negar,
encarou com desdém a investigação. Na cadeia, tropeçou pela primeira vez,
enviando um bilhete determinando a destruição de um e-mail sobre venda de
sondas. Mas agora, com as mensagens em seu telefone, eu diria: perdeu, playboy,
na linguagem plebleia, mas o adequado é: perdeu, Príncipe.
São evidentes, mesmo com as barreiras de códigos, as
relações íntimas entre a Odebrecht e o governo. Cúmplice na Lava-Jato, pede um
contato ágil com o grupo de crise do governo. Esperar um contato ágil do grupo
do governo é sonho de executivo. De todas as maneiras, isso demonstrava como
estavam juntos, na tarefa de escapar da polícia.
Recados como este a Edinho Silva, tesoureiro da campanha
de Dilma: avisa a ela que pode aparecer a conta da Suíça. Não é preciso grandes
decifradores para supor que a campanha do PT foi feita com dinheiro que veio da
Suíça. Bem que desconfiei. Uma campanha tão bem educada: a grana vinha da
Suíça. Esse tópico é tão interessante que quase todos fingiram não notar, como
se não olhar para a bomba impedisse que exploda.
Odebrecht usou métodos de máfia, ao mobilizar dissidentes
da Polícia Federal para melar a Lava-Jato. Tudo indica que foram esses
dissidentes, numa outra ação, que colocaram uma escuta clandestina na cela de
Alberto Youssef, na esperança de anular o processo. Está quase tudo lá no
telefone de Marcelo. Amigos poderosos, propinas, orientação para artigos. Numa
dessas, ele reclama que o foco da Lava-Jato está sobre os empreiteiros e é
preciso deslocá-lo para os políticos. Mas a tática está dando certo. Políticos
são mais experientes e escorregadios. O grande material contra eles virá
precisamente das delações, de anotações como essas do iPhone.
Marcelo Odebrecht optou pelo silêncio. Mas deixou pistas
pelo caminho. Como se dissesse; se querem me pegar, trabalhem um pouco com a
cabeça. Ele terá que se explicar ao juiz Sérgio Moro. Mas se usar a tática do
bilhete, destruir/desconstruir, vai se dar mal. É hora de contar tudo ou então
assumir as consequências. Até plano de fuga, saída Noboa, estava previsto em
suas mensagens. Noboa é um dirigente equatoriano que fugiu do país para a
República Dominicana.
Chega de esconde-esconde. Isso vale também para Dilma e o
PT. Em Portugal, abriram-se investigações sobre o negócio entre telefônicas no
Brasil. Uma equipe peruana vem investigar no país o caso Odebrecht, pois
suspeita que houve corrupção. Os americanos monitoram a Odebrecht. O Brasil
virou uma grande cena do crime. Qualquer dia vão nos cercar com aquelas fitas
pretas e amarelas e chamar os turistas para filmarem o PT, aliados e a
Odebrecht, dizendo que não roubaram nada. Foi tudo dentro da lei. Só pela cara
de pau mereciam uma punição extra.
Hoje, Dilma, Renan e Eduardo Cunha constituem um
triângulo das Bermudas. Nele desaparece toda a esperança. Cunha agora é contra
Dilma, Renan também. Há quem ache que é preciso poupá-los porque são contra
Dilma. Mas hoje quase todo mundo é. Cunha está sendo acusado de levar US$ 5
milhões da Toyo Setal. Um dos indícios era o requerimento que a deputada
Solange Gomes apresentou para pressionar os empresários. O requerimento foi
produzido no computador de Cunha.
Fui deputado com os dois, Cunha e Solange. Um dia, ela
veio com um jabuti para acrescentar numa medida provisória: isentar a indústria
nuclear de alguns impostos. Fui perguntar o que era aquilo e ela não sabia
responder. Percebi que era apenas uma assinatura de aluguel. Trabalhava em
sintonia com Eduardo Cunha. Quando surgiu essa pista do requerimento de
Solange, mesmo antes de descobrirem que veio do computador de Cunha, na solidão
do quarto hotel, soltei o grito da torcida do Atlético Mineiro:
— Eu acredito!
As próximas semanas devem ser decisivas contra essas
forças que ainda dominam o Brasil mas estão em contradição com ele. Ministros,
deputados, presidentes e ex-presidente, todos farão o esforço final para
escapar da enrascada. Dilma contra Cunha, Renan contra Dilma, Dilma contra
Renan, eles podem dançar à vontade o balé dos enforcados. Lembram-me uma canção
da infância, nascida nas rodas de capoeira: “A polícia vem, que vem brava, que
não tem canoa cai n’água. Pau, pau, peroba, foi o pau que matou a cobra.” Pelo
menos cantávamos, naquela época.
Hora de recomeçar.
2 comentários:
O Gabeira se tornou um dos jornalistas mais coerente dos últimos tempos.
Depois de dizer que sabia o que estava fazendo como subversivo e que queriam implantar uma ditadura comunista, comecei a admirar pela coerência, pois desmontou a tese desse bando de comunistas hipócritas que diziam que lutavam na ditadura pela democracia, a começar por Dilma et caterva.
OK. Está codificado, ainda não se decodificou, mas.. porque codificar?! Se assim o fez é porque não era/é para ficar aberto ao entendimento de qualquer um. Por que?
Por que precisava ser codificado, ou seja, escondido algo que era para ser público? É óbvio que tem maracutaia, principalmente porque envolve cabeças-de-merda como alguém disse: os comunistas.
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