Sheila, ao lado, mãe solteira grávida, elogia o atendimento médico que recebe, mas se queixa do salário mensal de R$ 35,00 que recebe como técnica de recursos humanos, como também do rancho básico para gestantes que não dá para nada e dos plantões que faz sem receber hora extra. Ela mora na zona central de Havana (prestem atenção à pobreza da roupa da cubana e ao mau estado do edifício ao fundo dela, regra geral em Cuba). A reportagem é da Folha de S. Paulo deste domingo.
Flávia Marreiro, da Folha deste domingo, ao publicar a reportagem intitulada "Exportação de médicos em massa afeta sistema de saúde
cubano", começa contando a história da cubana Sheila González, que ela viu caminhando em Havana sob o sol a pino, rodeada de
edifícios em ruínas, escombros quase bonitos de um bombardeio que não ocorreu. Ela também apreciou in loco o sistema de saúde de Cuba e a perversidade com que a ditadura dos Castro trata a exportação de médicos para fazer caixa e com isto pagar suas aventuras, incompetência, desperdício e roubalheira. Leia tudo:
Grávida de Daniel há sete meses, a futura mãe vive em uma
zona pobre no centro da capital cubana, Havana. Carregando o almoço do dia, Sheila pode ser considerada o
símbolo do sistema de saúde cubano que, ao lado da educação, é hoje a maior
bandeira dos guerrilheiros que chegaram ao poder em 1959.
No país que ostenta uma das mais baixas taxas de
mortalidade infantil do continente, é prioridade zero cuidar da gravidez da
moça de 27 anos, mãe solteira, técnica em recursos humanos.
. "Minha ginecologista e a médica da família são muito
exigentes. Estão atentas a tudo. Ao meu peso, ao peso dele, à minha pressão.
Sei que meu filho está em boas mãos, antes e depois de nascido", conta
Sheila, que, abaixo do peso ideal no começo da gravidez, entrou num programa
estatal que reforça a dieta, com almoço diário.
. "Gosto do meu país. Não falo mal do governo. Falo o
que acho que tem que melhorar", diz ela. E começa a citar o salário de US$
15, a cesta básica para gestantes que é insuficiente e por que duvidou em ter
mesmo Daniel.
(...)
Sem falar dos salários baixíssimos e dos plantões não
remunerados que fazem.
Para completar, a exportação de médicos em massa,
intensificada na última década, também é um fator de pressão no sistema. Sheila
se queixa. "Muitos médicos bons se foram. Muitos só pensam de forma
gananciosa."
Em outra ponta da cidade, a professora Alina Guerra, 56,
diz que médico nunca faltou, mas ela só voltou a se consultar quando Dorália,
sua médica, voltou da Venezuela.
Para a pediatra Consuelo (nome fictício), a exportação de
médicos ao Brasil terá efeitos concretos. Quando dois de seus companheiros
forem ao Mais Médicos nos próximos meses, ela conta que vai dobrar os plantões.
"Os cubanos brincam dizendo 'Vai à Venezuela fazer o
que?', o amigo responde 'Em uma missão?', e ouve: 'Não, vou ver meu
médico'."
De acordo com a pesquisadora Julie Feinsilver, autora de
estudos sobre a saúde na ilha, não é possível dizer se falta médico ou se é
apenas uma questão de percepção, por causa da má distribuição.
Para ela, o sistema de saúde é um dos aspectos que dão
legitimidade ao governo. Segundo Feinsilver, "a saúde da população
cubana" é, para o governo dos irmãos Castro, "uma metáfora da saúde
do corpo político" da ilha.