O MPF identificou os policiais federais dissidentes. Eles agiram para desestabilizar seus colegas da Lava Jato e com isto forjar provas de nulidade, beneficiando os ladrões do Petrolão - petistas, petroleiros e empreiteiros. O caso do grampo encontrado por Youssef, foto ao lado, foi uma emboscada. -
Ministério Público Federal denunciou na última semana
formalmente por calúnia o delegado e o agente da Polícia Federal que acusaram
irregularidades e coação envolvendo a cúpula de delegados da Operação Lava
Jato, em Curitiba (PR) – onde estão concentradas as apurações de corrupção e
cartel na Petrobrás.
A reportagem é de Ricardo brandt, Fausto Macedo e Júlio Affonso, do Estadão de hoje.
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A acusação entregue à Justiça Federal no dia 11 é a
primeira ofensiva contra suposta tática de contrainteligência que investigadores
da Lava Jato identificaram, a partir do final de 2014. A estratégia seria
desestabilizar as apurações e tentar algum tipo de nulidade legal na condução
do caso, que atingiu a partir de novembro do ano passado as maiores
empreiteiras do País e seu papel e conluio com os dois principais partidos do
governo federal, PT e PMDB. Um rombo de pelo menos R$ 19 bilhões nos cofres
públicos até aqui.
Eles são acusados de se associarem “para ofender a honra
dos colegas”, apontando grampos ilegais na cela do doleiro Alberto Youssef –
peça central da Lava Jato, e cujo fato teria poder de anular provas da
investigação – e vícios na sindicância aberta para conduzir o caso.
A Procuradoria pede abertura de ação penal por
calúnia, que prevê pena de seis meses a
dois anos de prisão e multa, aumentada
em um terço da pena por envolver vítima agente público no exercício da função.
Vítimas. As supostas vítimas dos dois federais são seis
delegados da Lava Jato, alguns deles que integram a cúpula da Polícia Federal,
em Curitiba, como Rosalvo Ferreira Franco, superintendente regional no Paraná,
e Igor Romário de Paula, delegado regional de combate ao crime organizado. Além
do delegado Mauricio Moscardi Grillo, responsável pela apuração interna sobre o
suposto grampo clandestino na cela do doleiro.
Narra a denúncia que em março de 2015, o delegado Fanton,
lotado na delegacia da PF em Bauru (SP), de Polícia Federal, desembarcou em
Curitiba – sede das investigações da Lava Jato, envolvendo alvos sem direito a
foro especial – para cumprir “missão” de “conteúdo sigiloso” na
Superintendência da Polícia Federal no Paraná.
“Antes da conclusão do apuratório, no dia 30 de abril de
2015, não foi dada continuidade à missão, pelo que Fanton deveria retornar à
delegacia de origem”, registra o procurador da República Daniel Holzmann
Coimbra.
Nesse período, o agente Werlang cumpria função no Núcleo
de Inteligência da PF (NIP), em Curitiba, comandado pela delegada Daniele
Rodrigues – também alvo das supostas calúnias. Os dois federais denunciados
teriam se encontrado entre os dias 2 e 3 de maio, “imediatamente após o
afastamento de Fanton”.
O assunto seria o afastamento do delegado. “Após esses
encontros, associaram-se para ofender a honra dos colegas que entendiam ser os
responsáveis pelo afastamento”, registra a denúncia.
A partir de então, os dois passaram a apontar que a
escuta encontrada em abril e a sindicância que apurou o caso. Para isso, teriam
se envolvido em suposto plano que incluiu um depoimento colhido de forma ilegal
do agente Dalmey, um depoimento à Corregedoria da PF em que Fanton comunicou
falsa coação a um terceiro agente envolvido no episódio da escuta na cela de
Youssef.
“Na segunda-feira (04 de maio), no hotel em que Fanton
estava hospedado, e sem nenhum procedimento formalmente instaurado, ele tomou
depoimento de Dalmey, o qual relatou supostos vícios na sindicância 04/2014,
sindicância esta acerca da escuta ambiental localizada por Alberto Youssef no
forro da cela que ocupava”, registra a Procuradoria.
No mesmo dia, o delegado Fanton levou ao Ministério Público
Federal acusação de que três delegados das investigações da Lava Jato, Igor,
Daniele e Moscardi, “coação no curso do processo”. “Fui coagido a manipular
provas no inquérito pelo dpf Igor, sua esposa dpf Daniele, dpf (delegado da
Polícia Federal) Moscardi e ate do escrivão do feito”, escreveu ele em mensagem
eletrônica encaminhada à Procuradoria.
Na Corregedoria-Geral da Polícia Federal, dois dias
depois, Fanton também disse que agente federal conhecido como “Bolacha” sofreu
algum tipo de pressão para não indicar eventuais culpados “no decorrer da
sindicância” realizada em 2004.
“Bolacha” é o agente Paulo Romildo Rossa Filho.
Responsável pela carceragem da PF, ele havia prestado depoimento na sindicância
04/2014 conduzida pelo delegado Moscardi e concluída em setembro de 2014, após
localização de aparelho de captação de áudio na cela em abril, informa a
denúncia contra os dois federais. A conclusão foi que não houve irregularidades
e que o equipamento era inativo.
“Ao contrário do que insistem os acusados em dizer, não
houve nenhuma espécie de coação sobre o agente Romildo no que diz respeito ao
seu depoimento perante a sindicância realizada no ano de 2014″, sustenta o
procurador do Grupo de Controle Externo da Atividade Policial do MPF.
“Tampouco existiu a afirmada coação a Fanton por parte
dos delegados Igor, Daniele e Moscardi.”
O procurador encerra a denúncia com a afirmação de que
“Fanton e Dalmey tinham plena ciência, a todo tempo, de que essa coação não
existiu”. No pedido de abertura de ação penal por calúnia, Coimbra arrolou como
testemunha de acusação o agente Rossa Filho, conhecido como Bolacha. O
procurador não integra a força-tarefa da Lava Jato.
relatorio da pf odebrecht
Dissidentes. A denúncia do órgão, externo à Lava Jato,
reforça as suspeitas dos investigadores de que o episódio pode ter relação com
suposta tática adotada por empreiteiras do cartel para tentar anular a Lava
Jato.
Em maio, investigadores descobriram que assessorias de
imprensa contratadas por empreiteiras do cartel, entre elas a da construtora
Norberto Odebrecht, ajudaram a “difundir” para os jornais, rádios e TVs o
conteúdo dos depoimentos dos dois federais denunciados.
No dia 2 de julho, os dois policiais federais foram
convocados pela Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Petrobrás, após essa
divulgação dos depoimentos dos dois acusados, onde confirmaram a existência das
supostas escutas ilegais.
No relatório que pediu seu indiciamento, a PF aponta como
figura central desse suposto plano o presidente da empreiteira, Marcelo Bahia
Odebrecht – preso desde o início de julho.
Trecho de relatório de indiciamento de presidente e
executivos da Odebrecht
Trecho de relatório de indiciamento de presidente e
executivos da Odebrecht que cita ‘dissidentes’ da PF
O delegado Eduardo Mauat da Silva chama a atenção para as
anotações do empresário feitas após sua prisão, que registram “trabalhar para
anular (dissidentes PF…)”.
“Uma referência clara à Polícia Federal, ou pelo menos a
alguns de seus servidores”, informa o delegado. “Marcelo teria a intenção de
usar os ‘dissidentes’ para de alguma forma atrapalhar o andamento das
investigações, e, se levarmos em consideração as matérias (grampo na cela,
descoberta de escuta, vazamento de gás, dossiês) veiculadas nos vários meios de
comunicação, nos últimos meses, que versam sobre uma possível crise dentro do
Departamento de Polícia Federal, poder-se-ia, hipoteticamente, concluir que tal
plano já estaria em andamento.”
Os policiais federais Fanton e Werlang não foram
localizados pela reportagem para comentar o caso. A Odebrecht nega que tenha
adotado medidas para atrapalhar as apurações da Lava Jato.