A vida política e institucional incorporou à sua rotina o discurso de exaltação ao município, mas que na prática vem servindo para encobrir desigualdades e injustiças em relação à distribuição dos recursos arrecadados pela União. Decerto, a maioria daqueles que fazem do município peça de sua retórica não está empenhada em selar compromissos ou retirar obstáculos que afetam drasticamente a vida das cidades. A rotina de nossas municipalidades tem sido marcada pelo acúmulo de encargos e responsabilidades sem a devida contrapartida em recursos, especialmente quando o tema é saúde, edu- cação, saneamento básico ou assistência social.
Neste ano eleitoral, no entanto, o Senado, pressionado pela tensão entre os entes federados e o governo central, por uma distribuição mais igualitária de recursos públicos, acaba de criar uma comissão para formular um novo pacto federativo. Em 60 dias, cientistas políticos, economistas e experts na matéria entregarão à Casa um diagnóstico sobre as relações tributárias e políticas entre União, Estados e municípios. Novamente, o exame dos problemas que explodem no âmbito municipal exclui os prefeitos numa recorrente desvalorização do poder local.
Embora com orçamentos insuficientes (do bolo arrecadado, a União fica com 59%, os Estados com 27% e os municípios com 14%), as prefeituras têm sido submetidas a intensa fiscalização dos órgãos públicos de controle, respondido a ações judiciais para atender demandas da saúde e enfrentado toda sorte de dificuldades para não ferir a Lei de Responsabilidade Fiscal. Mas é no município que se verificam a situação de abandono dos hospitais, a falta de estrutura das escolas, o atraso no saneamento básico, a deficiência no transporte escolar, o crescente índice de criminalidade, problemas relacionados a essa relação de dependência financeira crônica.
É por estas razões que os prefeitos passam grande parte de sua gestão correndo em busca de recursos, gastando o tempo que poderiam dedicar às demandas comunitárias. Assim, o reexame destas relações pelo Senado ainda poderá proporcionar o debate que conclua por uma nova concepção de estrutura federativa, considerando as competências e os recursos financeiros necessários aos municípios. É a mudança que esperamos do Congresso Nacional em relação à forma como se decide hoje, em que se atende em primeiríssimo lugar prioridades orçamentárias e políticas do poder central.
* Artigo publicado no jornal Zero Hora desta sexta-feira.
Nenhum comentário:
Postar um comentário