A multiplicação devastadora de novas notícias sobre os rumos finais das investigações da Lava Jato, desta vez chegando aos chefes, Lula e Dilma, chegaram a conduzir para o segundo plano uma reportagem extraordinária da revista Veja, !" A Lava Jato e a Face Oculta", que expõe com detalhes uma investigação iniciada numa pequena casa de câmbio devastou o partido político que esteve no governo de Portugal durante seis anos e levou à cadeia figurões considerados acima de qualquer suspeita. As semelhanças com o petrolão vão muito além de coincidências.
O caso envolve diretamente Lula e o PT.
A reportagem é de Rodrigo Rangel, enviado a Lisboa.
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O ex-presidente Lula e o ex-primeiro-ministro português
José Sócrates, que está preso: laços de amizade, interesses comuns e a Justiça
no encalço
O ex-presidente Lula e o ex-primeiro-ministro português
José Sócrates, que está preso: laços de amizade, interesses comuns e a Justiça
no encalço(Ricardo Stuckert/PR/VEJA)
É meio da tarde em Évora, cidade portuguesa a 150
quilômetros de Lisboa. Na penitenciária local, o sol forte e o calor do verão
europeu lembram um ambiente tropical. O dia é de visita para uma parte dos 49
detentos. Aos poucos, familiares e amigos formam uma pequena fila para cumprir
o ritual constrangedor obrigatório em qualquer lugar do mundo. A revista é
minuciosa. Pertences pessoais devem ser deixados na portaria. À exceção das
carteiras, que podem ser levadas desde que o visitante permita aos guardas
contarem o dinheiro na entrada e na saída. O cuidado é para prevenir corrupção
dentro da cadeia. No recinto de pouco mais de trinta metros quadrados que serve
sala de visitas, dois homens usando ternos elegantes destoam. Ao ouvirem o
barulho das trancas, eles ficam de pé, numa evidente reverência ao preso que
aparece por trás da grade de ferro - o número 44. O ex-primeiro ministro
português José Sócrates.
Encarcerado desde novembro do ano passado, Sócrates foi o
chefe do governo de Portugal de 2005 a 2011. É um dos mais influentes hierarcas
do PS, o Partido Socialista, agremiação que divide o protagonismo da política
portuguesa com o PSD, o Partido Social Democrata. De tênis, calça jeans e
camisa social azul clara, mangas arregaçadas, o líder socialista sentou-se em
uma das mesas ao lado de outros cinco detentos, entre eles um suspeito de
assassinato e um policial acusado de receber suborno de bandidos. Naquela
última quinta-feira de agosto (27), Sócrates apresentava um semblante calmo e
sorriu algumas vezes, embora o abatimento fosse visível. Acusado de corrupção,
lavagem de dinheiro e fraude fiscal, ele é, até agora, o alvo mais importante
das investigações que já colocaram muita gente poderosa de Portugal na mira da
Justiça.
O enredo que levou o ex-primeiro-ministro à cadeia é
recorrente e soa familiar: políticos agiam em conluio com grandes empresas em
troca de comissões ou, em português bem brasileiro, propina. É essa a acusação
que pesa sobre José Sócrates - e que o mantém em prisão preventiva há nove
meses. Descobriu-se que ele tinha amigos poderosos, influentes e muito ricos.
Esses amigos ficariam ainda mais ricos, mais influentes e mais poderosos em seu
governo, e, em retribuição, o ajudariam a construir a própria fortuna. Em
Lisboa, as autoridades prenderam aquele que seria o chefe da organização
criminosa e tentam, a partir do topo, minar os escalões intermediários. As
autoridades já localizaram contas milionárias na Suiça em nome de familiares de
Sócrates, descobriram que existem empresas brasileiras envolvidas no esquema,
detectaram digitais de personagens do mensalão e do petrolão e estão convictas
de que não são apenas coincidências.
A exemplo do que dos políticos brasileiros investigados,
Sócrates e seus aliados acusam o Ministério Público e a justiça de perseguição.
Diz estar preso por "razões políticas". Mas o que já se conhece sobre
o caso é apenas uma pequena parte da investigação - que corre sob segredo.
"O fato é que é uma investigação que já dura 18 meses e até hoje não houve
uma acusação formal. Isso me parece uma interferência indevida da justiça na
política", disse a VEJA o deputado socialista Paulo Campos, um dos
correligionários mais próximos de Sócrates e ex-secretário de obras de seu
governo. Além das semelhanças e coincidências, existem conexões claras entre os
personagens e o modelo de corrupção luso-brasileiro.
Empreiteiras envolvidas no escândalo do petrolão aparecem
ligadas a alvos da investigação portuguesa. Empresas portuguesas investigadas
em Lisboa, com o Banco Espírito Santo e a Portugal, aparecem como suspeitas de financiar
o esquemas brasileiros, como o mensalão. Essa conexão, num primeiro momento,
foi facilitada pela afinidade política: a proximidade entre o PT brasileiro e o
Partido Socialista português, especialmente nos anos do governo de José
Sócrates e de Lula no Brasil. As boas relações entre dos dois lados abriu
caminho para negócios e negociatas de empresas amigas do poder, de um lado e de
outro. Envolvem, até agora, três empreiteiras brasileiras ligadas ao petrolão.
O mesmo Grupo Lena acusado de ser o maior contratante dos serviços de Sócrates,
tem como parceira principal a Odebrecht - cliente das remessas ilegais feitas
pela famosa casa de câmbio de Lisboa. A fusão dos personagens de lá e daqui
chamou a atenção das autoridades.