A sociedade brasileira apenas reage, porque aqui vigora a cultura do descaso

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by Nilson Mariano

Título original: Uma sociedade que apenas reage

Quantas vezes já se viu algum motorista falando ao celular enquanto dobrava a esquina, apenas uma das mãos ao volante, e nada se fez? Em quantas oportunidades se encontrou um tablete de margarina com o prazo de validade vencido, exposto no mercado, mas não se chamou o gerente para recolher o alimento?

Quantas vezes já se atravessou uma avenida fora da faixa de segurança?

Ainda sob o impacto da tragédia que matou pelo menos 236 jovens em Santa Maria, especialistas consultados por ZH apontam que falta atitude ao brasileiro. Não sugerem, é óbvio, que cada pessoa se invista em fiscal do vizinho. Mas a passividade pode ser fatal. Abdicar do exercício da cidadania é compactuar com a negligência, o desapego à lei, a corrupção. É estimular a burla dos gananciosos que descumprem normas na busca do lucro fácil, como forrar a boate com uma espuma barata e de baixa qualidade, que expele fumaça venenosa se pegar fogo.

Um dos mais destacados antropólogos, Roberto DaMatta alerta que a sociedade brasileira não é proativa – no sentido de exigir seus direitos e defender as causas públicas. Define-a como “reativa”, age de forma solidária e emocionada quando sobrevém a destruição e o luto.

– Deixa que chegue ao pior para tomar uma medida, as quais são sempre insatisfatórias – lamenta.

DaMatta diz que o Brasil contraiu um pacto com o ente apelidado de Sobrenatural de Almeida, segundo o qual “não vai dar nada”, “nada acontecerá de ruim” e pequenas transgressões serão perdoadas. É por isso que se dirige acima do limite de velocidade, não se é cordial nas filas, solta-se sputniks em uma boate superlotada com arquitetura de gaiola.

– Eu, que já estou no terceiro tempo da vida (76 anos), fico abismado com a atração dos jovens pelo perigo – comenta.

Estado recebe toda a responsabilidade

Autor de livros como Carnavais, malandros e heróis, DaMatta indaga: o que aconteceria, diante do conjunto de irresponsabilidades que precedeu o incêndio em Santa Maria, se a boate Kiss estivesse num país como o Japão? Aposta que haveria suicídios, conforme o código de honra dos samurais. Na Argentina, após o fogo que matou 194 jovens na República Cromañón em 2004, funcionários e fiscais públicos foram condenados à prisão. Para o antropólogo, os desdobramentos aqui são imprevisíveis: a impunidade é outro mal brasileiro.

– Como pode ter um megaevento desses, com banda num espaço fechado, e com pirotecnia? – questiona.

À indulgência do brasileiro, o sociólogo Francisco de Oliveira agrega outro componente de risco. É a mania de se esperar que governos resolvam tudo. Professor emérito da Universidade de São Paulo, adverte que o Estado “está despreparado”, não se renovou para atender a uma sociedade que evoluiu de rural para urbana e industrial.

– O Estado está desaparelhado, o único que faz é correr atrás do prejuízo – ressalta.

Um dos fundadores do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap), Chico Oliveira, como é chamado entre os seus pares, desanima-se com as perspectivas. Não vislumbra o que denomina de “remédio” a curto prazo. A inércia do cidadão e a inépcia das autoridades cimentaram uma montanha pesada demais para ser removida.

– Infelizmente, a passividade é uma característica da sociedade, enquanto as instituições estão superadas. Temos um governo que não atua, não tem caráter preventivo, e isso vai continuar assim – diz Oliveira.

6 comentários:

  1. Políbio,
    Resumindo: É UM LIXO!
    Abraços

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  2. A culpa indireta foi a greve da UFSM e o MEC que obrigou a essas vitimas ficarem em Santa Maria para recuperar as aulas perdidas no mês de Janeiro, pois num período normal de férias não haveria toda quantidade enorme de alunos e demais presentes nesta boate.

    Nesta boate mostra aquilo que diz que as deficiências não se somam, mas se multiplicam.

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  3. DaMatta sofre do mesmo mal que o resto dos brasileiros. É incapaz de ver que os donos da Kiss não são "empresários em busca do lucro fácil", porque não é nada fácil mesmo ter uma boate mesmo nas condições em que a Kiss estava. O problema que DaMatta não vê (ou finge que não, senão talvez seria escurraçado nas ruas) é que 99% DOS BRASILEIROS são preguiçosos e lenientes. Faço um desafio: se uma boate ao lado da Kiss com tudo como recomenda o figurino AMERICANO de prevenção de incêndio, anunciasse isso antes da tragédia e cobrasse 50% mais, qual teria mais movimento? A Kiss ou esta outra boate? A Kiss estaria lotadinha... Faço outro desafio: daqui um ano, repetir o mesmo teste em outro lugar... Aposto no mesmo resultado! Assim como ninguém dá bola para incêndio, ninguém da bola para o perigo de beber e dirigir, usar o celular e dirigir, ninguém dá bola para bosta nenhuma, até que aconteça a tragédia, aí, demonizaram o cara se for rico, se for empresário, e se for pobre ou assalariado, será uma "fatalidade"...

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  4. Bah! A ZH dando aula de ética, moral e desenvolvimento. A que ponto chegamos no cinismo.

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  5. "É estimular a burla dos gananciosos que descumprem normas na busca do lucro fácil..."
    Será que existe maior compactuação da ganancia de poderosos do que o povo gaúcho esta fazendo ao ver o governador do Estado retirar do CAIXA ÚNICO mais de UM BILHÃO DE REAIS para suprir o DEFICIT que está causando ao Estado com sua política eleitoreira e que busca o populismo?
    Eu acho que não, pois, certamente este é um dinheiro que alguém terá de pagar a conta em algum momento, e certamente não será este (des)governador, além de se saber que o CAIXA ÚNICO um dia não terá mais recursos para dele serem retirados.
    E não é só pagar a conta, pois além do valor retirado teremos que repor os juros correspondentes.
    Então a maior compactuação começa aí neste momento.
    O resto é apenas uma consequencia.

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  6. "É a mania de se esperar que governos resolvam tudo". Como o brasileiro vai resolver algo se vive dentro de uma garrafa de cerveja? Basta olhar em volta.

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